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Até padrinho de Blatter na Fifa pede sua saída: ‘Ficou obcecado pelo poder’

Eduardo Ohata

Responsável por introduzir Joseph Blatter na Fifa e conhecido como “pai do marketing esportivo”, o britânico Patrick Nally, 68, se juntou ao coro que pede a renúncia imediata do suíço do comando da entidade que comando o futebol mundial.

“[Se eu pudesse], eu o aconselharia a aceitar o fato de que deve deixar a presidência da Fifa imediatamente e oferecer seu apoio à próxima gestão, seja ela qual for. Acho que está claro que chegou a hora de ele abandonar [o cargo]. Sua permanência, obviamente, não está ajudando em nada”, afirmou a este blog Nally, sobre o presidente afastado da Fifa.

Patrick Nally, responsável pela introdução de Blatter na Fifa

Além de fechar o contrato que tornou a Coca-Cola patrocinadora da Copa do Mundo, Nally aconselhou a Fifa a contratar Blatter para seu primeiro cargo na Fifa, no setor de patrocínios e desenvolvimento, ainda na década de 70. À época, lembra Nally, do secretário-geral à recepcionista, trabalhavam apenas dez pessoas na Fifa. Ao participar do projeto de desenvolvimento do futebol na África e Ásia, Blatter fez contatos que foram preciosos anos depois para sua ascensão à presidência da entidade.

“Estou desapontado com Blatter. A Fifa já vinha sendo bem-sucedida desde a época do [brasileiro João] Havelange, mas nos últimos anos Blatter decidiu se ‘vender’ como o único responsável [pelo sucesso da Fifa], o que não o colocou em posição favorável. Ele perdeu sua direção, ficou obcecado com o poder”, dispara o ex-mentor do suíço. “Para mim, foi aí que ele perdeu a credibilidade, sua visão do que era a Fifa e virou as costas para pessoas que o ajudaram, como eu e Havelange. Mas ninguém jamais pensou que ele se tornaria o homem que acabou virando.”

Para Nally, o escândalo de corrupção na Fifa está se tornando um “evento de mídia”, onde todos querem “revisar a história, desafiar e atacar”. “O maior risco é como a Fifa sobreviverá, porque a investigação pode durar para sempre. A tragédia é que isso não é sobre futebol, e o futebol e a Fifa têm que seguir em frente. O perigo é que tudo o que a Fifa de certo poderá ruir, o que seria triste. Alguém, em algum lugar, tem que aparecer com uma fórmula para a Fifa seguir em frente e não vá ao colapso à medida que a investigação continuar.”

O britânico, que também esteve à frente de ações revolucionárias no Comitê Olímpico Internacional e federações esportivas, acredita que a forma como os líderes do futebol são escolhidos tem que passar por uma reformulação, que torne a Fifa mais democrática. “Acho que essa próxima eleição na Fifa deveria ser cancelada. Não dá para simplesmente o Blatter sair e outro presidente, eleito pelo mesmo sistema, assumir. Acredito que a Fifa e o futebol deveriam ser controlada por quem mais investe no futebol: a massa, os milhões de fãs do futebol. O esporte é dos fãs,  jogadores, técnicos, patrocinadores, TVs e outros atores, que tem que estar representados. Têm que estar envolvidos no processo.”

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Rio-2016

“É triste. O Brasil passa por momentos econômicos e políticos dramáticos. Quando o Brasil foi escolhido como sede olímpica, o clima era muito, muito diferente. Portanto, o problema é que vocês estão tentando receber os Jogos em um clima difícil, político e econômico diferente. Será um grande desafio para o povo [brasileiro] não ser afetado pelos problemas no Brasil. No fim, os Jogos serão bem organizados, mas é díficil disfarçar que a Olimpíada está chegando ao Brasil naquele que provavelmente não é o melhor momento. O país precisa festejar o Jogos, o que é difícil se você enfrenta maciços problemas sociais e políticos. É uma contradição: Olimpíada é celebração de esportes, o povo tem que estar em um clima de festa, o que é difícil com questões sociais. Será dificil.”

CBF

“Ocorre na CBF o mesmo que a Fifa. A Fifa e a CBF são gerenciadas pelos mesmos indivíduos por anos e anos. O esporte não tem sido bem gerenciado, mas manipulado por pessoas que visam seus próprios interesses, e por isso não querem mudanças no sistema. Mas ele tem que mudar. O fã, que é apaixonado pelo futebol, pela seleção e por seu time, não tem interação e tampouco controle. O esporte tem que ser controlado por partes independentes, que não visam ganhos financeiros pessoais. Os torcedores têm que estar representados e para isso é necessário uma mudança de estrutura. Os fãs têm que ficar confortáveis ao saber que o esporte está sendo dirigido pelas melhores pessoas possíveis. Mas tem que acontecer mudanças radicais.”

Patrocinadores

“Acho que eles [a Coca-Cola e o McDonald’s] não tinham escolha a não ser eventualmente pedir para que Blatter saia. A Coca-Cola, por exemplo, é uma empresa que está identificada com a Fifa desde o início, desde o programa de desenvolvimento [do futebol na África e Ásia] de Havelange e Blatter [na década de 70]. A mídia começa a olhar para ela também. Até ele [Blatter] deixar sua cadeira a Fifa e seu entorno estarão sob suspeita. Blatter se colocou em uma posição para ele ser perseguido pela mídia e os patrocinadores da Fifa também. Não acho que nada possa mudar isso até ele deixar a Fifa. Não há outra solução.”